A mãe, Anne-Marie Sartre (nascida Anne Marie Schweitzer), e o pai Jean-Baptiste Sartre, esperavam seu primeiro filho para fins de maio e início de junho. Oficial da marinha francesa, Jean Baptiste não pode esperar pelo nascimento da criança em Paris e partiu em missão. A criança nasceria bem depois do esperado – provavelmente por um erro de cálculo – em 21 de junho de 1905. A ele, seria dado o nome de Jean-Paul Sartre.
O ano de 1905 ia começar e, poucos meses depois, Anne-Marie daria à luz “uma pequena Annie” ou “um pequeno Paul”, como dizia, com flagrante predileção para que fosse menina. O ano de 1905 ia começar e, pela futura mamãe e pela criança, o oficial da Marinha decidiu renunciar à viagem ao Japão com que tanto sonhava. Guerras coloniais, doenças e pressões hierárquicas contribuíram bem depressa para a desistência: desde então, Jean-Baptiste só pensa em voltar para a terra firme. Percorre ministérios, gabinetes, candidata-se a um cargo de “redator da Marinha”, recorre até a pistolões oficiais, contempando as soluções mais absurdas.
A pequena Annie (ou o pequeno Paul) vai nascer nos primeiros dias de junho, lá por fins de maio talvez, com um pouco de sorte, espera Jean-Baptiste, cuja licença sem soldo expira impreterivelmente no dia 15 de maio; o regulamento é muito severo: qualquer falta será punida. Ocorre, então, uma espécie de corrida contra o tempo para encontrar emprego em terra antes da data fatal, talvez com o desejo secreto de que a criança nasça prematura. (…) No dia 14 de maio, contrariado, J.-B. deixa Paris e vai para Toulon. No dia 29, desesperado, embarca no torpedeiro La Tourmente, como segundo-oficial que parte primeiro rumo a Sicília, depois Creta, com escalas em Messina, Palermo e Canea. De cada um desses portos, ele telegrafa à mulher; e durante todos esses primeiros dias no mar espera a participação do nascimento. (…) Todo mundo, então, em Creta, em Thiviers, em Paris, começa a esperar. Os Schweitzer alugaram um casarão no Mâconnais e o “erro de cálculo” traz muitos transtornos: quanto mais a criança demora a nascer, menores as chances de poder ser levada para fora de Paris. Enfim, esse contratempo é realmente lamentável. “Continuamos sem notícias do nosso marinheiro”, escreve de Thiviers a futura vovó Sartre em 21 de junho. Poucas horas depois, o vovô Schweitzer expede dois telegramas, um para Creta, outro para Thiviers: comunica o nascimento de um menino.
Jean-Paul Sartre chega ao mundo com atraso e, desde o início, atrapalha uma porção de planos familiares. Mas sua chegada coincide com certo número de acontecimentos políticos que vão marcar o século: 1905 é o ano das primeira revolução bolchevique, da guerra entre a Rússia e o Japão, ou, mais próxima ainda, da lei nacional que decreta a separação entre a Igreja e o Estado.
Trecho de Sartre – Uma biografia, de Annie Cohen-Solal
Jean-Baptiste Sartre morreria no ano seguinte em sua terra natal, Thiviers, por complicações advindas de uma doença crônica adquirida em uma missão na Conchinchina. Órfão de pai com pouco mais de um ano de idade, Jean-Paul foi criado pela família mãe e pelos avós maternos, a família Schweitzer.
De Jean-Paul Sartre a Coleção L&PM Pocket publica Esboço para uma teoria das emoções e A imaginação.