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“O caso dos dez negrinhos” por Martha Medeiros

(Crônica publicada no livro Montanha Russa que acaba de chegar em uma nova e linda edição)

Se existe uma culpada pela minha quedinha por romances policiais, acuso: chama-se Agatha Christie. Foi através de seus Assassinato no Expresso OrienteCipreste triste O caso dos dez negrinhos que me rendi ao gênero e que mais tarde aprendi a gostar também de Patricia Highsmith, outra dama da literatura de suspense. Pois um amigo que mora na Alemanha e com quem troco correspondência virtual me informa que a revista Der Spiegel noticiou que os herdeiros da escritora decidiram proibir a utilização do título O caso dos dez negrinhos nas futuras reedições. Esse título é ofensivo, uma vez que negro é uma palavra pejorativa, argumentaram eles. A partir de agora o romance se chamará E não sobrou nenhum.

E não sobrou nenhum livro com o título "O caso dos dez negrinhos"

E não sobrou nenhum livro com o título “O caso dos dez negrinhos”

Com todo respeito: é levar demasiadamente a sério essa febre do politicamente correto. Se a moda pega no Brasil, alguns livros poderão sofrer rebatizados semelhantes. O Navio negreiro, de Castro Alves, e a lenda do nosso Negrinho do pastoreio poderão entrar na mira dos defensores de um vocabulário menos ultrajante e virar Navio com passageiros de cor O afro-americaninho do pastoreio. Clássicos como A moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo, e O mulato, de Aluísio Azevedo, com sorte, escaparão ilesos.

Esse não precisa mudar... ufa.

Esse vai escapar… ufa.

É bom lembrar que a lista de termos considerados incorretos não se restringe às classificações de raça. Notas de um velho safadode Charles Bukowski, poderá se transformar em Notas de um indivíduo de idade avançada com atenção fortemente voltada para o sexo, e a obra-prima de José Saramago, Ensaio sobre a cegueira, poderá trazer em suas novas edições o título Ensaio sobre o desprovimento de capacidade visual.

Será que o velho safado vai ter que mudar?

Será que o velho safado terá que se comportar melhor?

A gente poderia ficar aqui até amanhã se divertindo com essas traduções. Não nego (do verbo negar) que a expressão negrinho só é simpática para nominar aquele doce também conhecido como brigadeiro, pois ele tem um oponente, o branquinho, e assim ninguém se sente diminuído. Até pode ser que a troca do título de um livro ajude a melhorar as relações entre pessoas de raças diferentes, vá saber. Mas, sinceramente, acho uma forçação de barra, uma patrulha que cada vez mais nos enquadra num comportamento padronizado e  nos impede de ser politicamente alegres e sem ranço.

Bukowski além da boa e limpa poeira

Apesar do estilo intenso de Bukowski levar a vida – tinha o álcool como fiel companheiro e não raro estava metido com drogas e orgias –  foi a leucemia que, em 9 de março de 1994, deu fim à vida de Henry Charles Bukowski Jr. – ou Hank para os íntimos. “Don’t try” é o recado que ficou na lápide de seu túmulo, em Los Angeles. Parece que nem mesmo ele acreditava que chegaria tão longe, pois sempre que o assunto era morte, o tom beirava a ironia. Abaixo, um poema do livro As pessoas parecem flores finalmente com tradução de Claudio Willer.

encômios

após a morte
exageramos as boas qualidades de alguém,
nós as inflamos.

durante a vida
frequentemente sentimos repulsa pela mesma pessoa
enquanto falamos com ela ao telefone
ou só de estar no mesmo aposento.

e frequentemente criticamos o jeito como
andam, falam, vestem-se
vivem
creem.

mas é só morrerem
então que criaturas elas
se tornam.

se apenas em uma cerimônia fúnebre
alguém dissesse,
“que indivíduo odioso
esse aí foi!”

que em meu funeral
haja só um pouco de verdade,
e depois a boa e limpa
poeira.

Buk_morte

Mas se depender da L&PM, o velho Hank jamais morrerá. Prova disso são os livros da série Bukowski.

“As pessoas parecem flores finalmente” na Folha de S. Paulo

O Caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo de sábado, 11 de julho, traz um texto do poeta e jornalista Ciro Pessoa sobre o mais recente livro de Charles Bukowski, publicado pela L&PM.  As pessoas parecem flores finalmente, com tradução de Claudio Willer, recebeu a avaliação “muito bom” da Folha:

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E vem mais novidade por aí. Ainda este ano, a L&PM lança, de Bukowski, Queimando na água, afogando-se na chama e On Writing (ainda sem título em português). Além disso, Miscelânea septuagenária será lançado em pocket.

Parabéns a John Fante, o mestre de Bukowski

E hoje tem mais aniversário para comemorar. O escritor John Fante nasceu em 8 de abril de 1909 e foi, segundo Charles Bukowski, o seu “salvador”. Isso porque, quando o velho Buk ainda era o jovem Buk, ele encontrou uma velha edição de Pergunte ao pó, de Fante, na Biblioteca Pública de Los Angeles. Segundo suas próprias palavras, foi “ouro no lixo”. Bukowski apaixonou-se pelo personagem de Fante, Arturo Bandini, um aspirante a escritor sem recursos que mora em motéis baratos, passa fome e se embebeda sempre que pode. Foi a inspiração que faltava para Bukowski seguir o caminho de uma literatura visceral, de humor ácido e carregada de passagens autobiográficas. No livro Cartas na rua (que tem previsão de lançamento para julho pela L&PM), Bukowski diz que Fante é seu autor preferido. E no artigo “Eu conheço o mestre”, que está em Pedaços de um caderno manchado de vinho, ele conta como descobriu “John Bante” (assim mesmo, com “B”, numa escrachada brincadeira): “Eu tinha um cartão da biblioteca e tirei John Bante de lá. Levei-o comigo de volta para meu quarto e comecei a ler do início. Ele chegava a ser engraçado às vezes, mas era um tipo estranho e calmo de humor, como um homem queimado até a morte que ainda assim acena com um piscar de olhos para o primeiro homem que ateou as chamas…”.

John Fante era filho de imigrantes italianos pobres e toda a sua literatura estava ligada às suas origens. Mas assim como Bandini, Fante não teve o devido reconhecimento em vida e trabalhou durante 40 anos como roteirista em Hollywood. Sua trajetória só começaria a mudar a partir dos anos 1980, quando a Black Sparrow Press, editora dos livros de Bukowski, tirou Pergunte ao pó do limbo. Foi a vez do discípulo salvar o mestre. Fante morreria em 1983, já cego devido ao diabetes.

1933 foi um ano ruim e Sonhos de Bunker Hill são os livros de John Fante na Coleção L&PM POCKET.

A inédita miscelânia do septuagenário Bukowski no Jornal Estadão

A matéria do Estadão fala sobre Miscelânea septuagenária, o último livro escrito por Charles Bukowski que chegou ao Brasil pela L&PM Editores. O texto é de Guilherme Sobota e foi publicado no Caderno 2 do dia 4 de outubro:

[BR - 1]  CADERNO_2/CADERNO2/PÁGINAS ... 04/10/14

Para ler, clique sobre a matéria

Auto-ajuda no estilo Bukowski (se é que isso é possível)

Que tal alguns conselhos de Charles Bukowski, esse escritor que sempre compartilhou seus pontos de vista e opiniões sem filtro. Em seus textos, o velho Buk forneceu uma gama abundante de dicas de como passar seus dias. O Beat Museum (Museu dedicado aos beats) compilou algumas de suas citações e, a partir delas, organizou dez conselhos valiosos para quem quer levar uma “kick-ass life” (uma vida fodida). Aí vai:

1. NÃO SE ACOMODE

“Eu quero o mundo inteiro ou nada.”

careta_bukdedo

2. AME A SI MESMO

“Nunca me senti só. Gosto de estar comigo mesmo. Sou a melhor forma de entretenimento que eu posso encontrar.”

maquina beijo

3. ÀS VEZES, ENLOUQUEÇA

Essas pessoas que nunca enlouquecem devem levar uma vida, verdadeiramente, horrível.”

buk_caretinha

4. NÃO TENHA MEDO DA DOR

“Você tem que morrer algumas vezes antes de realmente viver.”

buk_melancolico

5. SEJA AUTÊNTICO

“É melhor fazer uma coisa maçante com estilo do que algo perigoso sem estilo.”

buk_flores

6. LEMBRE-SE DE QUE VOCÊ É MAIS FORTE DO QUE PENSA

As vezes você levanta da cama de manhã e pensa, eu não vou conseguir, mas então você ri por dentro lembrando todas as vezes que já sentiu isso.”

buk_roupao

7. NÃO TENHA MEDO DA MORTE

Levo a morte em meu bolso esquerdo. Às vezes, tiro-a do bolso, e falo com ela: ’oi gata, como vai? Quando virá me buscar? Vou estar pronto’.”

bukowskigrave

8. NÃO DESISTA OU NEM COMECE

“Se você vai tentar, vá até o fim, caso contrário, nem comece.”

buk fusca

9. NÃO ESPERE SER TARDE DEMAIS

Existem coisas piores que estar sozinho, mas geralmente leva décadas para entender isso e quase sempre quando você entende é tarde demais. E não há nada pior que tarde demais.”

buk_gato

10. NÃO LEVE A VIDA TÃO A SÉRIO

“Às vezes você só precisa mijar na pia.”

Buk feliz

Quer mais conselhos? No recém lançado Miscelânea Septuagenária tem mais um monte de dicas.

O parceiro de Bukowski

MEU PARCEIRO

sentado sob esta
luz
olhando para o
Buda.

o Buda
ri
de mim
e de
todas as coisas:

chegamos
tão longe
e fomos
a lugar nenhum.

vivemos
muito
e
tão pouco
afinal.

o Buda
está rindo.

o Buda é
esta estátua de
porcelana
diante
de mim
nesta noite.

enquanto os poemas
não
chegam.

(De Miscelânea septuagenária, livro recém lançado de Bukowski que traz contos e poemas inéditos)

Miscelanea_Septuagenaria

Bukowski animado

O ilustrador Jonathan Hodgson fez uma uma animação baseada no poema “The Man with Beautifull Eyes” de Charles Bukowski. O curta tem pouco menos de 6 minutos e foi produzido para a rede pública de TV britânica Channel Four e ganhou prêmios em vários festivais internacionais, incluindo o Bafta, o mais importante da Grã-Bretanha. Assista à versão legendada em português pelo blog Velho Bukowski:

A L&PM publica boa parte da obra poética de Charles Bukowski nos livros O amor é um cão dos diabos e Textos autobriográficos, ambos na Coleção L&PM Pocket.

Eis o poema que inspirou a animação, ainda sem tradução oficial para o português:

the man with the beautiful eyes – Charles Bukowski

when we were kids
there was a strange house
all the shades were
always
drawn
and we never heard voices
in there
and the yard was full of
bamboo
and we liked to play in
the bamboo
pretend we were
Tarzan
(although there was no
Jane).
and there was a
fish pond
a large one
full of the
fattest goldfish
you ever saw
and they were
tame.
they came to the
surface of the water
and took pieces of
bread
from our hands.

Our parents had
told us:
“never go near that
house.”
so, of course,
we went.
we wondered if anybody
liveed there.
weeks went by and we
never saw
anybody.

then one day
we heard
a voice
from the house
“YOU GOD DAMNED
WHORE!”

it was a man’s
voice.

then the screen
door
of the house was
flung open
and the man
walked
out.

he was holding a
fifth of whiskey
in his right
hand.
he was about
30.
he had a cigar
in his
mouth,
needed a shave.
his hair was
wild and
and uncombed
and he was
barefoot
in undershirt
and pants.
but his eyes
were
bright.
they blazed
with
brightness
and he said,
“hey, little
gentlemen,
having a good
time, I
hope?”

then he gave a
little laugh
and walked
back into the
house.

we left,
went back to my
parents’ yard
and thought
about it.

our parents,
we decided,
had wanted us
to stay away
from there
because they
never wanted us
to see a man
like
that,
a strong natural
man
with
beautiful
eyes.

our parents
were ashamed
that they were
not
like that
man,
that’s why they
wanted us
to stay
away.

but
we went back
to that house
and the bamboo
and the tame
goldfish.
we went back
many times
for many weeks
but we never
saw
or heard
the man
again.

the shades were
down
as always
and it was
quiet.

then one day
as we came back from
school
we saw the
house.

it had burned
down,
there was nothing
left,
just a smouldering
twisted black
foundation
and we went to
the fish pond
and there was
no water
in it
and the fat
orange goldfish
were dead
there,
drying out.

we went back to
my parents’ yard
and talked about
it
and decided that
our parents had
burned their
house down,
had killed
them
had killed the
goldfish
because it was
all too
beautiful,
even the bamboo
forest had
burned.

they had been
afraid of
the man with the
beautiful
eyes.

and
we were afraid
then
that
all throughout our lives
things like that
would
happen,
that nobody
wanted
anybody
to be
strong and
beautiful
like that,
that
others would never
allow it,
and that
many people
would have to
die.

O gif biográfico do Bukowski

Um dos memes de maior sucesso nas redes sociais em 2013 foi o “gif biográfico”, uma sequência de imagens animadas em forma de gif com legendas curtas e objetivas, que destacam características ou momentos importantes da biografia de alguém. O objetivo é, quase sempre, fazer graça sobre a vida do artista ou personalidade, o que, geralmente, dá certo!

Fizemos um gif biográfico de um dos autores mais queridos da casa, Charles Bukowski, vejam como ficou:

bukgif

Charles Bukowski

Bukowski e os cavalos

Bukowski nasceu em 16 de agosto de 1920. Na foto, ele com seus pais

Bukowski nasceu em 16 de agosto de 1920. Na foto, ele com seus pais

Gelo para as águias

Sigo lembrando dos cavalos
sob o luar
sigo lembrando de

alimentar os cavalos
açúcar
pedras oblongas de açúcar
mais parecendo gelo,
e suas cabeças são como cabeças
de águias
cabeças calvas que
poderiam morder e

não mordem.

Os cavalos são mais reais que
meu pai
mais reais que Deus
e poderiam ter pisado nos meus
pés mas não pisaram
poderiam ter feito coisas horríveis
mas não fizeram.

Eu tinha quase 5 anos
mas ainda não consegui esquecer;
ó meu deus eles eram fortes e bons
as línguas vermelhas molhadas
projetadas para fora de suas almas.

Poema publicado no livro Textos autobiográficos