Por Ivan Pinheiro Machado
Robert e seu irmão estavam intrigados. O motor fazia um barulho diferente e a barcaça curiosamente não saía do lugar. Parecia que a hélice girava no vazio. O diagnóstico era fácil: a embarcação levava um carregamento de pedras e, com o peso, o casco estava próximo ao lodo no fundo do canal. Naquele ponto, no Sena, as pessoas jogavam de tudo no rio e algo havia se enroscado na hélice. Desligaram o motor e cada um dos irmãos pegou um arpão. Depois de várias tentativas, um deles conseguiu firmar o objeto intruso e finalmente Robert o arrancou das engrenagens. Para espanto dos irmãos, na ponta do arpão havia um braço humano. Este é o mote. Mais um problema para o comissário Maigret. Ou melhor, dois problemas. Chamada a polícia, foram retirados do fundo do rio mais uma perna, um tronco, outro braço… e nada da cabeça. Portanto, era preciso descobrir, primeiro, quem viria a ser o morto e, depois, quem o matou.
Inédito no Brasil Maigret e o corpo sem cabeça é, entre todos o “Maigrets”, um dos mais verdadeiros e emblemáticos do célebre comissário.
O gênio de Georges Simenon resplandece nesta história que ultrapassa o gênero policial. É um livro tão profundo que pode até decepcionar os mais ortodoxos amantes do gênero. Pois ele se eleva a um patamar maior, que é a grande literatura e mergulha nas profundezas da condição humana. Desesperança, desamor, solidão, tristeza, fraquezas e incertezas são mazelas próprias do homem e que estão, frequentemente, na origem do mal e do crime.
Nesta história genial o leitor verá, até o ponto final na página 171, que foi guiado pela mão de um mestre que questiona, diverte e, sobretudo, emociona milhões de leitores em todo o mundo.