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Borges e Kafka em Buenos Aires

Começa segunda-feira, dia 19, em Buenos Aires, a Bienal Borges – Kafka 2010, segunda edição do evento cultural e artístico organizado pela Fundação Internacional Jorge Luís Borges e pela Sociedade e Centro Franz Kafka de Praga. Fazem parte da programação mesas redondas, seminários, peças de teatro e exibições de cinema, além de um simpósio que terá a participação de especialistas nos dois escritores. O único brasileiro convidado é Sergius Gonzaga, Secretário de Cultura de Porto Alegre, que falará sobre Kafka na literatura nacional. A programação vai até dia 30 de abril, então ainda dá tempo de você comprar a passagem.
 

Para ver a programação completa (e dois vídeos dos diários de Kafka), clique aqui.

Das necessárias reuniões

* Por Tiago Maino Pinheiro

García Márquez, o Gabo, já pairava ali, ele e alguns outros mais; parecia recordar seus anos de solidão. Dostoiévski, que entre amigos atendia pela alcunha de Dodô, também adentrava sala. Reunião costumeira, cada dia em lugar diverso, reunia célebres de todos os cantos.  Tal qual Machado, o Assis, que chegou logo depois, alegando hora perdida porque mais uma feita o interpelaram pela rua no intento de explicações sobre uma dissimulada Capitu. Hemingway aportou logo em seguida, desculpando atraso fruto dum velho do mar, ou algo do gênero, que o parara a fim de contar algumas aventuras de pescador, histórias sobre certo peixe lutador.
Scliar deu ares em seguida, disse que vinha de outros lados, duma festa de castelo, a qual Eurípedes, que logo também viria ao encontro, bem podia abastecer com vinhos e tudo o mais; pois conhecia, parece, quem plenamente entendia de festeiro e embriagante assunto. Mais tarde, à entrada, junto aos Veríssimos, os quais havia encontrado pelo caminho, e já sabatinando todo mundo sobre qual era a questão, apresentou-se o garboso e eloquente Shakespeare. Dos lusitanos ares, Saramago, quase que ensaiando uma cegueira, tateou porta logo depois.
Já à mesa, Orwell infinitamente explanava sobre seu grande irmão; que espiava ali, olhava acolá, curioso de dar dó. Falando em grande, Fitzgerald mostrava-se saudoso pelo velho amigo Gatsby. Em frente, Huxley, que achou melhor ponderar sobre o vindouro, proferia sobre um admirável e novo mundo, coisa assim. Já Kafka, que se entretia com uma barata que passeava sob a mesa, bem parecia, em verdade, ter quase indecifráveis lembranças. O bichinho logo alumiou também Orwell, que de imediato trocou o assunto do irmão para o de uma fazenda que tinha bichos falantes e revolucionários; fato que despertou ainda a memória de Lewis Carroll, que logo relatou duma menina que falava com coelhos e coisas mais. Drummond, em cadeira de balanço, só observava. À porta, relatando a odisseia que passara para chegar ali, Homero também dava as caras.
Como se de caravana tivessem vindo, em discussões fartamente animadas, outros tantos de repente também adentraram local; vinham ali Clarice, Millôr, Chico, Rachel, Nelson, Vinícius, João do Rio, Alencar, Quintana, Ubaldo, Lygia, Prata. Gente boa que não findava mais. Quanto mais as figuras se aproximavam, maior vontade surgia de se chamar mais e mais convivas para aquela festa de sublimes inventores; encontro de perenes contadores da vida, os quais, sem pestanejar, faziam boa questão de abertamente deixar suas histórias contagiarem o mundo.  Júbilo inebriante. Tal reunião era sempre benquista, tanto que, já de conhecida ciência, sucedia sempre em lugares diferentes; lugares que, aliás, de forma bastante frequente, também atendiam, ou melhor, se entendiam como afortunadas e bem variadas mentes.

* Tiago Maino Pinheiro é pós-graduando em Jornalismo Digital e graduado em Letras. É autor do blog www.dascronicas.blogspot.com