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Como diria Humphrey Bogart…

Por Ivan Pinheiro Machado

Sempre teremos Paris – 1

Tanto o maravilhoso livro “Paris: biografia de uma cidade” de Colin Jones (L&PM, 2004), como “Paris: uma história”, da Série Encyclopaedia (Coleção L&PM Pocket) de Yvan Combeau, apontam as origens da cidade de Paris para mais de três séculos A.C. quando a tribo celta Parisii estabeleceu-se nas margens do Sena, próximo ao que hoje conhecemos com Ilê de la Cité. Onde, aliás, está a Polícia Judiciária, local de trabalho do nosso querido Comissário Maigret.  Passou a ser Lutécia, quando o imperador romano Julio César derrotou o gaulês Vercintorix. O nome Paris foi consagrado no século III, sob o Império Romano. Em 451, sofreu o assédio dos bárbaros, chefiados por Átila, que desorganizou a geopolítica da Europa.  Recuperou-se, seguiu sendo uma cidade romana, até que, em 481, Clóvis I assumiu o poder, depois de derrotar o último exército romano. De lá para cá, Paris criou uma mitologia apoiada numa longa e fascinante história. E entre centenas de odisseias, foi palco da Revolução Francesa de 1789. A revolução que mudou o mundo. A partir dela, o ocidente começou a sair das sombras do autoritarismo, do feudalismo e sob as divisas generosas de “liberdade, igualdade e fraternidade” contaminou os continentes com seu humanismo radical. Max Gallo, consagrado escritor e historiador francês escreveu o belo “Revolução Francesa” dividido em dois volumes (“O povo e o rei” e “ Às armas cidadãos!”). Lançado na França em 2006, este livro obteve enorme êxito de público, atingindo o topo das listas dos best-sellers, pois pela primeira vez a história da “Revolução” foi contada com agilidade de uma reportagem e a emoção de um romance. Em setembro, a L&PM  lançou a versão pocket deste extraordinário trabalho de Max Gallo.

Sempre teremos Paris – 2

A mitologia que envolve a cidade vem sendo cuidadosamente aquecida através dos séculos. Nem Henrique IV, protestante, ao assumir o trono de Paris, em 1593, resistiu aos encantos da cidade. Constrangido por motivos políticos em converter-se ao catolicismo, disse a célebre frase: “Paris vaut bien une messe” (Paris vale uma missa). Modernamente, a cidade foi beneficiada por duas leis fundamentais para sua imortalidade. A primeira fez 50 anos, a Lei Malraux de1962 que regula a conservação definitiva dos prédios antigos históricos ou não, fixando vantagens fiscais para a sua restauração. A segunda lei, de 1968, também de André Malraux, no tempo em que foi ministro de De Gaule, prioriza o pagamento do imposto de transmissão de herança – no caso de espólios de grandes artistas ou colecionadores – em obras de arte cedidas em uso fruto ao governo e aos “Museus Franceses”. Graças a esta lei é que existe o Museu Picasso, com centenas de obras do mestre e milhares de doações de telas dos maiores pintores da história para os grandes museus da França. Nesta mesma linha, de cultuar e preservar o seu passado, é uma tradição da cidade registrar com placas nas ruas o endereço de grandes homens ou de grandes feitos, assim como homenagear os seus heróis que “caíram em defesa da França” durante a  segunda Grande Guerra. Veja abaixo alguns exemplos, como o prédio em que Picasso pintou Guernica, uma das obras de arte mais célebres de todos os tempos e que por coincidência serviu também de cenário para uma das obras mais famosas de Balzac, publicadas na Coleção 64 Páginas”: “A obra-prima ignorada”.

 

Sempre teremos Paris – 3

Uma cidade como Paris, com uma história conhecida há bem mais de 2 mil anos, tem muitas e muitas tradições,  lendas e superstições que vão nascendo e se realimentando através do tempo. Há uma (que já registramos neste blog) que é muito recente, não tem 10 anos. A tela de arame que serve de murada na Pont des Arts (uma das pontes sobre o rio Sena, só para pedestres) está abarrotada de cadeados como você pode ver na foto abaixo. A outra foto é da década de 90, que mostra como era a ponte antes. Sabe-se lá de onde veio, mas esta é uma das (poucas) fórmulas do amor eterno; você compra um cadeado, escreve o seu nome e o do seu amor (de preferência dentro de um coração), fecha este cadeado na tela da Pont des Arts em Paris, joga a chave no Sena e… pronto. Este amor será para sempre.

A Pont des Arts hoje, repleta de cadeados

A Pont des Arts no início dos anos 90. À esquerda, Ivan Pinheiro Machado. No centro, Laís Pinheiro Machado. À direita, Eduardo Bueno

Sempre teremos Paris – 4

Talvez o dia 25 de agosto de 1944 seja a segunda maior data da França. Foi neste dia que as brigadas irregulares, as forças da Resistência Francesa, a guarnição França Livre mais as Forças Francesas do Interior, apoiadas pela 4ª. Divisão de Infantaria do Exército dos Estados Unidos, entraram definitivamente em Paris para expulsar as forças nazistas que ainda lá se mantinham. Há muitas histórias que cercam este dia mágico. Uma das mais saborosas está contada no livro de Dan Frank “Minuit – Les aventuriers de l’art moderne (1940-1944)” e revela bem o clima daquele dia. Algumas tropas de combatentes não alinhados tinham se antecipado aos exércitos regulares que invadiram Paris. O escritor Ernest Hemingway e o também escritor André Malraux eram veteranos da Guerra Civil Espanhola, onde tinham lutado nas brigadas internacionais ao lado dos republicanos contra o ditador fascista, o generalíssimo Francisco Franco. Ambos estiveram presentes na tomada de Paris. Esta é a história que encerra o livro:

“Malraux e seus “maquis” encontram Hemingway e seu grupo de “resistentes” armados no dia da libertação. Eles estão bebendo no bar do Hotel Ritz depois de expulsarem os últimos alemães, requisitarem suítes e colocar os “guerrilheiros” para descansar. Neste mesmo momento, o General De Gaule, as forças da França Livre mais os americanos recém cruzavam as fronteiras da cidade. Ambos estão bêbados. Malraux vê Hemingway e exclama:

– Ernest!
Eles não se vêem desde a Guerra da Espanha.
– De onde você vem?
– De longe. Strasburgo… E você?
– Eu estava em Rambouillet – responde Hemingway.
– Você está só?
– Não, eu tenho uma pequena tropa. E mostra três “maquis” que dormem nos sofás do bar.
Malraux sorri e pergunta:
– Quantos homens você comandou nesta guerra?
Hemingway pensa, faz um pequeno cálculo e diz:
– Às vezes dez, às vezes duzentos. E você?
– Eu? O coronel pensa e diz – dois mil homens.
– Pena que não nos encontramos antes, replica Hemingway, se levantando.
Ele boceja, se espreguiça e se volta para o chefe da legendária brigada Alsacia-Lorena:
– Se você estivesse conosco teríamos tomado esta cidadezinha há muito tempo…
– Que cidadezinha? Pergunta Malraux.
– Paris!

Hemingway em 1944

Mais exposições em Paris: boêmios, “Os impressionistas e a moda” e Chaim Soutine

Já falei aqui no blog sobre a exposição de Edward Hopper. Mas o outono de Paris oferece outras exposições magníficas. No mesmo imenso Grande Palais que oferece Hopper aos visitantes, mas numa ala totalmente independente, realiza-se mais uma bela mostra, “Bohèmes”, com 750 quadros. Nela, documentos e fotos mostram desde a Renascença até os nossos dias a representação da vida mundada e daquilo que se convencionou chamar de “boemia”. Modernamente, seria a vida nos cafés, boates, restaurantes, cenas que, no passado, estariam reservadas a todas as pessoas e os ambientes que expusessem hábitos e uma vida desregrada. Os quadros expostos são de mestres célebres e vêm desde a Idade Média até os modernos como Picasso, Manet, Monet, Kandinski, Toulouse Lautrec etc. A mostra foi inaugurada em 26 de setembro e ficará aberta até 14 de janeiro de 2013.

Outra exposição importante tem lugar no museu de Quai d’Orsay, cujo acervo permanente inclui obras que vão do fim do classismo até os precursores da arte  moderna com obras de Van Gogh, Degas, Renoir, Gauguin e Toulouse Lautrec entre muitos outros. Trata-se da exposição “Os impressionistas e a moda”. Alguns dos mais importantes artistas que pintaram Paris em Paris estão representados com seus quadros que mostram minuciosamente a moda do seu tempo. Junto aos quadros estão expostos, em fotos ou fisicamente, os trajes masculinos e femininos representados. A exposição abriu no dia 25 de setembro e vai até 20 de janeiro de 2013.

Para completar a “reentrée” artística (que é como os franceses chamam a temporada nobre do ano que é a volta das férias de verão), temos duas exposições espetaculares e imperdíveis no museu l”Orangerie. Este museu que é um anexo do Louvre, antigamente abrigava o acervo impressionista que hoje está no Quai d”Orsay e hoje é destinado a exposições periódicas de arte contemporânea, além de mostrar permanentemente em salas especiais as imensas telas de Monet, as “Nymphéas”. As exposições são: a mostra da grande coleção de Paul Guillaume (1894-1931), um dos maiores marchands parisienses da primeira metade do século e a exposição retrospectiva de Chaim Soutine, (1893-1943) “L’Ordre Du Caos” de 3 de outubro até 20 de janeiro. (Ivan Pinheiro Machado)

 

75 anos de Guernica

Há 75 anos, no amplo estúdio da rue des Grands-Augustins em Paris, Picasso pintava sua mais célebre obra, “Guernica”, que seria exibida no pavilhão espanhol da Exposição Universal de Paris de 1937. O quadro é uma violenta explosão de fúria e indignação diante da destruição da cidade basca de Guernica em 26 de abril de 1937 pela aviação nazista que apoiava o general fascista Francisco Franco. A enorme tela de 7,80 metros  x 3,50 metros ainda produz em que o vê um choque devastador. A cena de horror e sofrimento transmitida através de uma grandiosidade monocrômica é um violento libelo contra a guerra e a morte. Mas até chegar ao museu Reina Sofia em Madrid, este quadro rodou muito. Reza a lenda que, inclusive, ele esteve na caçamba de um caminhão completamente atolado na lama nos arredores do pavilhão do Ibirapuera em São Paulo, onde foi a grande estrela da 2ª Bienal de São Paulo em 1953. Na época, o quadro foi cedido pelo MoMA, o Museu de Arte Moderna de Nova York, que era o seu fiel depositário.

A história das andanças de “Guernica” começa em 1939 quando Picasso, convidado por Alfred Barr Jr., o fundador e diretor do MoMA, faz sua primeira grande exposição em Nova York. “Guernica” e mais 300 quadros causaram um verdadeiro rebuliço nos meios culturais novaiorquinos. O sucesso foi enorme e Picasso e Alfred Barr se tornaram grandes amigos a ponto do pintor deixar o grande quadro emprestado para o MoMA “até o dia em que Francisco Franco morresse e fosse restaurada a democracia na Espanha”. Sob estas condições, “Guernica” deveria ser entregue para o museu do Prado que seria sua morada definitiva. Franco morreu em 1973, em junho, coincidentemente 3 meses depois de Pablo Picasso. O processo de redemocratização ainda demorou alguns anos e, depois de muita diplomacia, idas e vindas, com enorme má vontade, o MoMA cumpriu o acordo e devolveu “Guernica” à Espanha. Tão expressivo e tão famoso, o gigantesco painel monocrômico pintado praticamente em preto e branco acabou ganhando seu próprio museu, o Reina Sofia, um anexo do Museu do Prado no centro de Madrid. (Ivan Pinheiro Machado)

Guernica em exposição na Bienal de Arte de São Paulo de 1953. Na foto, Ciccillo Matarazzo, responsável por trazer a obra de Picasso, em destaque ao lado de Juscelino Kubitschek

Picasso é um dos títulos da Série Biografias L&PM.

21 de agosto: a Mona Lisa sumiu do Louvre

No final da tarde de 20 de agosto de 1911, um domingo, três homens entraram no Museu do Louvre, em Paris. Disfarçados de funcionários, esconderam-se até o cair da noite. Dezesseis horas depois, o quadro mais famoso do mundo, a Mona Lisa, tinha desaparecido. Como o museu não abria na segunda-feira, passaram-se 24 horas até que alguém percebesse o roubo. Foi somente na terça-feira, 22 de agosto de 1911, que a notícia se espalhou. A polícia apressou-se até a cena do crime, as portas foram trancadas e funcionários e visitantes, detidos. Mas o quadro já não estava lá há muito tempo. A França fechou suas fronteiras. E quando o museu reabriu, uma semana depois do roubo, os parisienses fizeram filas gigantescas para ver o lugar vazio do famoso quadro. Uma caçada mundial estendeu-se de Paris a Nova York, da Argentina à Itália, mas a misteriosa Mona Lisa não foi encontrada em lugar nenhum.

Picasso e Apollinaire foram presos sob suspeita do roubo, mas acabaram soltos por falta de provas. A direção do Louvre, o governo francês e o jornal Le Figaro ofereceram recompensas pela devolução da pintura, mas as pistas esfriaram… até que, dois anos depois, o marchand florentino Alfredo Geri recebeu uma carta que trazia a seguinte assinatura: “Leonardo”. A Mona Lisa estava à venda.

Onde ela estava? Quem a levara? No livro Roubaram a Mona Lisa!, a escritora R.A. Scotti volta no tempo e faz um relato vívido e minucioso deste que foi o maior roubo de arte da História. A autora revisita as origens da obra-prima de Leonardo da Vinci e constrói um romance policial baseado em fatos reais. Scotti conta que, dois anos depois do sumiço, Vicenzo Peruggia confessou a culpa e foi à julgamento em Florença. Mas o mistério não terminou por aí.

 

Depois da meia-noite em Paris

A sala é escura, gelada e repleta de sombras que pendem pelas paredes. Um clima que ajuda a fazer com que a viagem até a noturna Paris dos anos 30 seja instantânea. Ao entrar na exposição “Paris la nuit – Brassaï”, os mais sensíveis sentem um arrepio. E não é de frio. Na mostra de fotos deste que revelou a Cidade Luz em seus momentos menos iluminados, o preto e branco oferece tons que vão do dramático ao fantástico. Há mulheres despidas e árvores nuas. Há a névoa que desce do céu e a fumaça dos cigarros vagabundos. Há uma prostituta que espera na esquina e outras três que se exibem no bordel. Há espelhos absortos em paixão. Retratos embebidos em absinto.  

Madame Bijou

Brassaï, nome arstístico do húngaro Julius Halas, foi muito mais do que um fotógrafo. Se é possível capturar a alma em foto, ele o fez. Nascido em 1899, Brassaï chegou em Paris em 1924. Virou amigo de André Kertés, Salvador Dali, Kiki, Henry Miller e Picasso. Em 1929, ao vagar insone pelas ruas, criou o projeto “Paris à noite”, com fotografias que demonstravam seu amor pelo surrealismo das relações. Brassaï caçou, na luz noturna de Paris, o insólito, o desconhecido, o que é desprezado. Valorizou as prostitutas, os delinquentes, os trabalhadores noturnos. E transformou a arquitetura parisiense em personagem de seu delírio: silhuetas de sonhos.  

Solitária, uma das pontes de Paris

Na exposição, além das ruas, está a casa de Madame Suzy, os bares frequentados por transexuais, a porta dos mictórios públicos, os cafés com aromas de beijos proibidos. São estes os cenários que encontramos. As madrugadas parisienses com suas penumbras, seus faróis, sua amoralidade, seu jogo de luz, sombra, ação e reação. O que Brassaï conseguiu capturar com suas lentes, é algo que não se pode deixar de descobrir. A viagem, pelo menos aqui, é de graça. (Paula Taitelbaum*)    

Assim era Brassaï

*Paula Taitelbaum é escritora e coordenadora do Núcleo de Comunicação L&PM. No início de janeiro de 2012, ela visitou a mostra “Paris la nuit – Brassaï”. Exposição que, a partir de 18 de janeiro, está em Belo Horizonte e, em abril, integrará a programação do FestFotoPOA em Porto Alegre.

SERVIÇO – BELO HORIZONTE

Quando: de 18 de janeiro a 1 de abril de 2012

Onde: Espaço Oi Futuro

Av. Afonso Pena, 4001

Quanto: Grátis

Nos anos 1980, a L&PM publicou o livro Dias de Clichy, de Henry Miller, em que o escritor cita Brassaï.

“Guernica” por Carlos Saura

Guernica é preto, (…) como as manchetes dos jornais da época que dizem ao homem da rua, preto no branco, sua terrível verdade. É preto, cinza e branco como os filmes de atualidades e as fotos do front de Biscaia (…), de trama tão contrastada que ferem o olhar antes mesmo que se tenha identificado a imagem.

A composição, muito plástica, ordenada, harmoniosa, é forte, monumental, como convinha a uma decoração mural numa tal circunstância. É claramente figurativa, violentamente expressiva, com uma intensidade dramática que vai além do fato da atualidade, mostrando o que há nele de universal e de atemporal. A cidade é apenas simbolizada numa arquitetura elementar de fundo de cenário. Nada mostra uma Guernica real. Não se vêem aviões, nem bombas. A única arma é uma espada quebrada, na mão de um homem caído no chão em primeiro plano, de olho ainda aberto. À esquerda, uma mãe segura um filho morto (a julgar pela maneira como sua cabeça cai pra trás), berra de dor diante de um touro majestoso, tranquilo. Do outro lado, o duplo dessa mãe ergue os braços ao céu. Diante dela, uma terceira mulher, parcialmente ajoelhada, de rosto menos atormentado, estende-se em direção à dupla luz de uma lâmpada elétrica no teto e de uma lamparina nas mãos de uma quarta figura feminina, da qual somente aparece a cabeça, enorme. No centro, um cavalo parte em direção ao fundo do quadro e se volta, relinchando. Muitos serão os que tentarão decifrar esse conjunto de sinais, como se cada um devesse receber uma significação precisa; mas Picasso se contentará sempre em dizer que o cavalo é um cavalo, o touro é um touro, e que a força e a riqueza dos símbolos é que se pode interpretá-los amplamente.

O texto acima é uma releitura da Guernica, de Pablo Picasso, feita pelo biógrafo Gilles Plazy para a Série Biografias. Um dos quadros mais célebres do pintor espanhol também já ganhou diversas versões em murais e telas mundo afora e até em 3D. E agora chegou a vez do cinema se apropriar de uma das obras mais emblemáticas da história ocidental moderna.

Carlos Saura (o mesmo diretor de “Carmen” e “Tango”) está preparando um longa de ficção chamado “33 dias”, em referência ao tempo que Picasso levou para pintar a Guernica. Em entrevista ao jornal O Globo, o diretor disse que pretende “mostrar como o governo espanhol, em plena Guerra Civil, encomendou a Picasso um quadro de 8 m x 4 m para o pavilhão da Espanha na Feira Internacional de Paris, em 1937, para o qual colaboraram artistas como Miró, Dalí, Calder, Henry Moore e Luis Buñuel”. Em abril daquele mesmo ano, a cidade de Guernica, na Espanha, foi bombardeada por aviões italianos e alemães. Aquele foi um ensaio para os extermínios de civis realizados ao longo da Segunda Guerra Mundial e a fonte maior de “inspiração” para Picasso.

Saura quer retratar também aspectos da vida afetiva de Picasso que, segundo ele, se confundem com o processo de criação da Guernica. Dora Maar, pintora e fotógrafa francesa, amante de Picasso, registrou dia a dia a evolução do quadro. “As fotos feitas por Dora estão no Reina Sofía, assim como os esboços usados por Picasso para fazer uma pintura que pode ser encarada como um dos testemunhos mais impressionantes da inutilidade da guerra”, diz.

Saura ainda não definiu quem será o ator que interpretará Picasso no filme e, por enquanto, se ocupa com a escolha das locações na Espanha e em Paris. O filme “33 dias” ainda não tem data de estreia, mas é certo que sai em 2012, ano em que o diretor espanhol completa 80 anos de vida e 55 anos de carreira.

A autobiografia de Alice B. Toklas: Paris, Picasso, Matisse e a “Geração Perdida”

Gertrude Stein voltou com tudo em 2011. Primeiro, no mega sucesso internacional de Woody Allen, o filme “Meia noite em Paris”, onde ela e sua famosa casa na rue Fleurus 27,  em Paris, são protagonistas. E depois pela maravilhosa exposição “Matisse, Cézanne, Picasso: l’aventure des Stein”  no Grand Palais, em Paris, inaugurada dia 5 de outubro e que vai até 15 de janeiro de 2012.

Esta “A autobiografia de Alice B. Toklas” explica tudo. Alice foi a companheira de Gertrude pela vida inteira. E juntas foram testemunhas oculares do nascimento da arte moderna. Ela conta a sua história pela boca de Alice; no tempo em que Paris era uma festa e Picasso, Matisse, Cézanne e toda a arte moderna pintavam, amavam, se divertiam, sofriam e passavam fome na capital de todas as revoluções. Mais tarde nos anos 20, Gertrude trocou os pintores pelos escritores. Inventou a célebre expressão “Geração Perdida” para os jovens autores americanos que ela havia descoberto pelas ruas de Paris; Ernest Hemingway e Francis Scott Fitizgerald.

Enfim. “A autobiografia de Alice B. Toklas” é uma reedição importantíssima (foi lançado pela L&PM pela primeira vez no Brasil em 1984). Um livro imperdível, onde o você, leitor, através do talento de Gertrude Stein conhecerá a intimidade, os fatos, as histórias e as lendas de um período fundamental na história da arte e da literatura. (Ivan Pinheiro Machado)  

Alice e Gertrude, em 1944, no interior da França

Gertrude e Alice foram companheiras até o fim da vida

Gertrude e Alice foram companheiras até o fim da vida

Gertrude ajudou muitos artistas a alçarem vôos maiores

Alice e Gertrude na sua casa em Paris (clique para aumentar)

Os estrangeiros que sustentaram a revolução da arte moderna

No começo do século, todos queriam morar em Paris. Pintores miseráveis, escultores famintos, escritores em busca de espaço para suas inovações, bailarinos, dramaturgos, músicos, enfim, todos que tinham algo para dizer olhavam para Paris como a Meca das artes e do modernismo.

No que diz respeito à pintura, as grandes revoluções do final do século XIX e começo do século XX ocorreram exatamente em Paris. Foi lá que os impressionistas deram um golpe duro na arte acadêmica, assim como foi lá que surgiram o Cubismo, o Fauvismo, o Dadaísmo, o Surrealismo e outros “ismos” que mudariam a cara da arte.

Neste blog nós já falamos da espetacular mega-exposição da coleção dos Stein (Gertrude, Léo, Michael e Sarah) que conseguiram reunir no começo do século XX cerca de 600 obras de arte moderna. Com a absoluta indiferença dos franceses, especialmente dos parisienses, diante da revolução que era gestada na cidade, os estrangeiros assumiram o papel de comprar e difundir esta nova arte. Os quatro Stein conseguiram convencer suas compatriotas, as irmãs Claribel e Etta Cone de Baltimore, Maryland, a ir às compras no Salão de Outono e nas galerias dos históricos marchands Amboise Vollard e Daniel-Henry Kahnweiler. Com isso, elas acumularam 42 telas, 18 esculturas, 200 desenhos e gravuras de Matisse e também 114 telas e desenhos de Picasso.

A casa de Michael e Sarah Stein na Rue Madame, Paris, em 1907. Matisse está sentado no meio.

Na Rússia, destaque para Ivan Morosov, industrial do ramo têxtil e Serguei Chtchoukine (Sergej Sjtsjoekin), plantador de cereais. Ambos montaram fantásticas coleções de arte moderna entre os anos de 1890 e 1914. Juntos possuíam o maior conjunto conhecido de obras de Cézanne e Gauguin. As encomendas de Chtchoukine à Matisse, para decorar seu palacete em Moscou e dezenas de Picassos das fases azul e rosa fizeram a alegria dos museus soviéticos (e hoje dos museus russos) depois da revolução comunista de 1917.

Uma das salas da casa de Sergei Chtchoukine, outubro de 1911 (clique para ampliar)

Da Alemanha veio Karl Ernst, um dos poucos colecionadores que conseguiram se aproximar e frequentar o atelier de Cézanne. Ernst dividia sua paixão artística entre Cézanne e Matisse. Seu legado está reunido no museu de Essen na Alemanha. Uma grande coleção de pós-impressionistas e impressionistas foi reunida também pelo dinamarquês Christian Tetzen-Lund.

Todos estes estrangeiros tinham em comum a compreensão de que uma nova arte estava surgindo e o dinheiro para adquiri-la. Não que não houvesse grandes fortunas na França. Mas os ricos da época preferiam investir em móveis antigos, castelos, terras e quadros do século XVIII.

Por tudo isto é importante celebrar a coragem aventureira dos Stein, e nada mais justo do que esta grande homenagem que se presta em Paris, no Grand Palais, até o dia 15 de janeiro de 2012. Com o desinteresse dos franceses, foram os Stein e os outros estrangeiros que viabilizaram o mercado que sustentou estes jovens e miseráveis pintores. Sabe-se lá se, caso não houvesse russos, americanos, dinamarqueses e alemães estes pintores geniais não teriam mudado de ramo para sobreviver… (Ivan Pinheiro Machado)

A coleção Stein: o maior acontecimento cultural do ano em Paris

Por Ivan Pinheiro Machado*

“Matisse, Cézanne, Picasso: l’aventure des Stein” – Grand Palais, Paris 8º. De sextas às segundas das 9h às 22h; de terças às quintas das 10h às 22h. Entrada: 12 euros. De 5 de outubro à 15 de janeiro

“Uma rosa é uma rosa é uma rosa é uma rosa…” (“a rose is a rose is a rose is a rose”), poema escrito em 1914, tornou célebre a escritora Gertrude Stein (1874-1946). Esta genuína vocação para a vanguarda ela provaria uma década antes. Seu endereço parisiense, na rua Fleuris, 27, onde morava com seu irmão Leo e sua companheira da vida inteira, Alice B. Toklas, mais o grande apartamento  de seu irmão Michael e sua mulher Sarah, também em Paris, na rue Madame, 8, abrigaram nos primeiros 20 anos do século XX a maior coleção privada de arte moderna jamais reunida.

Em torno dos anos 1900 os franceses detestavam a arte moderna. O máximo que toleravam em matéria de modernismo eram os impressionistas, e apenas alguns, justamente os mais conservadores. Cubismos estranhos e sombrios de Picasso e cores feéricas e selvagens de Matisse eram motivos de risos e escândalo. Já os americanos e os russos entenderam que ali tinha alguma coisa. E foi graças a eles que Picasso, Matisse, Juan Gris, Cézanne, Marie Laurencin, Renoir, entre muitos outros conseguiram muitos pratos de comida.

Retrato de Gertrude Stein

Em 1903, Leo Stein comprou seu primeiro Cézanne. Um ano depois, Gertrude começaria a comprar Picassos (compraria 180 no total), enquanto seu outro irmão Michael e sua mulher Sarah comprariam praticamente toda a produção da época de Matisse (em torno de 200). Ao todo, entre desenhos, pinturas e esculturas, teriam sido cerca de 600 obras de arte acumuladas pela família Stein em 15 anos de compras. A coleção só não foi mais além, porque em poucos anos os quadros custariam 1000 vezes mais do que os Stein pagaram, inviabilizando a continuação da coleção. Foi então que eles começaram a vendê-la lentamente.

Sarah e Michel Stein retratados por Matisse

Os recursos que mantinham os irmãos Stein numa vida tão confortável em Paris vinham da venda da Omnibus Railway and Cable Company de San Francisco, empresa da família, e de muitos imóveis alugados na Califórnia. Um dos quadros emblemáticos da arte moderna e – junto com “Demoiselles d’Avignon” – precursor do Cubismo é, não por acaso, “Retrato de Gertrude Stein”, uma homenagem de Pablo Picasso que acabou colocando-a como uma das protagonistas (mesmo sem ser pintora) da grande revolução da arte moderna.

Nos anos 20, na euforia pós-guerra, depois de vender boa parte de sua coleção, Gertrude Stein voltaria a cena, treinando seus dotes de visionária. Desta vez, na literatura. Ainda em Paris, descobriria dois jovens escritores americanos: Ernest Hemingway e Francis Scott Fitzgerald.

Pois toda esta história está exposta agora em Paris nas paredes das Galeries nationales du Grand Palais, um fantástico palácio situado entre a avenida Champs Elisées e o Sena. A megaexposição foi inaugurada em 5 de outubro e deverá prosseguir até 15 de janeiro de 2012. É uma viagem fascinante que reúne o melhor da coleção Stein em cerca de 350 obras.

Uma exposição realizada nos melhores moldes das grandes exibições francesas: tudo muito bem explicado, perfeitamente iluminado, muito bem exposto e com a utilização de todos os recursos áudio-visuais disponíveis. Um trabalho impressionante da equipe do Grand Palais. Principalmente se levarmos em conta que a coleção deixou de existir dentro da família Stein nos anos 50 do século passado e que – pior ainda – desde os anos 20 foi sendo paulatinamente vendida. Foram anos de trabalho tentando localizar quadro por quadro nos lugares mais remotos do planeta. Mas o resultado é extraordinário e faz  de Matisse, Cézanne, Picasso: l’aventure dês Stein o maior acontecimento cultural do ano em Paris. E isso não é pouca coisa.

As imensas filas acabaram sendo turbinadas por uma incrível coincidência. Não bastasse a grande importância do conjunto exposto nas paredes do Grand Palais, a exibição passou a ter um poderoso reforço de marketing: o megasucesso cinematográfico de 2011, “Meia noite em Paris”, de Woody Allen, tem como centro de suas ações Gertrude Stein, sua casa e sua turma.

*Ivan Pinheiro Machado é editor e visitou a exposição em Paris quando estava a caminho da Feira do Livro de Frankfurt, na Alemanha. A L&PM publica A autobiografia de Alice B. Toklas na Coleção L&PM Pocket.

Picasso, Matisse e Cézanne juntos em Paris

No início do século 20, anos antes de estourar a 2ª Guerra Mundial na Europa, circulavam por Paris os artistas da chamada “geração perdida”. Em meio a festas e noitadas em bares, eles produziram romances, quadros e esculturas que seriam reconhecidas mais tarde como verdadeiras obras-primas da história da arte e da literatura mundial.

Uma das festas mais badaladas e “bem frequentadas” da época acontecia na casa da família Stein, que tinha se mudado de São Francisco, nos Estados Unidos, para a capital francesa. O famoso sobrado da Rue de Fleurus ocupado por Gertrude Stein e seus irmãos tinha as paredes “forradas” com mais de 200 quadros de alguns dos maiores gênios da pintura mundial como Picasso, Matisse, CézanneGauguin e Toulouse-Lautrec – só para citar alguns que frequentavam o local e deixavam por lá suas marcas.

É a própria Gertrude Stein quem conta as histórias desta época no livro Autobiografia de Alice B. Toklas (Coleção L&PM Pocket), que certamente serviu de inspiração para Woody Allen no filme Meia-noite em Paris. Aliás, quem assistiu ao filme, sabe bem do que estamos falando! E a boa notícia é que a partir de hoje (5/10), as obras do acervo de Gertrude Stein farão parte de uma exposição na galeria Grand Palais, em Paris.

Visitantes observam pinturas de Picasso e Cezanne, durante pré-estreia de exposição da coleção dos Stein

Quem estiver pela Cidade Luz não pode deixar de conferir! A exposição começa hoje e vai até o dia 16 de janeiro de 2012.