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Para entender as grandes óperas

Você sabia que a ópera é herdeira direta do teatro grego, em que os coros tinham papel de destaque?

A ópera é um gênero dramático no qual o canto assume o papel principal na apresentação. A música, no entanto, não é a única coisa que importa em uma boa ópera. Além de expressão musical, ela também é uma forma de expressão literária, pois ela conta uma história, criada e desenvolvida pelo chamado “libreto”, que nada mais é do que o seu roteiro.

A regra geral de uma ópera exige um enredo, uma história palpitante que faz mover todas as engrenagens da apresentação. E é isso, justamente, o que A. S. Franchini mostra em seu mais recente livro: Resumo da Ópera.

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Neste livro, o autor apresenta as histórias das 20 melhores óperas de todos os tempos em forma de pequenos e envolventes contos. Antes de cada um dos “resumos das óperas”, há um pequeno histórico sobre elas e seus autores.

É um dia de sol numa fervilhante plaza de Sevilha. O quartel militar dos dragões de Alcalá arde sob um calor escaldante. Ao lado está a fábrica de tabaco, de onde sai um grupo ruidoso de operárias. Os dragões fiam eufóricos diante do surgimento das alegres cigarreiras.

Um cabo chamado Morales, põe logo os olhos em Micaela, uma das mais belas jovens do grupo.

– Vejam todos, a pombinha parece perdida! – diz ele aos companheiros. – Vamos ver o que ela procura!

Morales aproxima-se de Micaela e lhe diz, sem rodeios:

– Procura alguém, minha querida?

– Sim, procuro um cabo – diz a bela jovem.

– Ora, viva! Pois não precisa procurar mais!

– Não é você – diz ela, imperturbável. – Procuro por Don José; conhece-o?

(Início de Carmen, de Georges Bizet, em O resumo da ópera, de A.S. Franchini)

“Guernica” por Carlos Saura

Guernica é preto, (…) como as manchetes dos jornais da época que dizem ao homem da rua, preto no branco, sua terrível verdade. É preto, cinza e branco como os filmes de atualidades e as fotos do front de Biscaia (…), de trama tão contrastada que ferem o olhar antes mesmo que se tenha identificado a imagem.

A composição, muito plástica, ordenada, harmoniosa, é forte, monumental, como convinha a uma decoração mural numa tal circunstância. É claramente figurativa, violentamente expressiva, com uma intensidade dramática que vai além do fato da atualidade, mostrando o que há nele de universal e de atemporal. A cidade é apenas simbolizada numa arquitetura elementar de fundo de cenário. Nada mostra uma Guernica real. Não se vêem aviões, nem bombas. A única arma é uma espada quebrada, na mão de um homem caído no chão em primeiro plano, de olho ainda aberto. À esquerda, uma mãe segura um filho morto (a julgar pela maneira como sua cabeça cai pra trás), berra de dor diante de um touro majestoso, tranquilo. Do outro lado, o duplo dessa mãe ergue os braços ao céu. Diante dela, uma terceira mulher, parcialmente ajoelhada, de rosto menos atormentado, estende-se em direção à dupla luz de uma lâmpada elétrica no teto e de uma lamparina nas mãos de uma quarta figura feminina, da qual somente aparece a cabeça, enorme. No centro, um cavalo parte em direção ao fundo do quadro e se volta, relinchando. Muitos serão os que tentarão decifrar esse conjunto de sinais, como se cada um devesse receber uma significação precisa; mas Picasso se contentará sempre em dizer que o cavalo é um cavalo, o touro é um touro, e que a força e a riqueza dos símbolos é que se pode interpretá-los amplamente.

O texto acima é uma releitura da Guernica, de Pablo Picasso, feita pelo biógrafo Gilles Plazy para a Série Biografias. Um dos quadros mais célebres do pintor espanhol também já ganhou diversas versões em murais e telas mundo afora e até em 3D. E agora chegou a vez do cinema se apropriar de uma das obras mais emblemáticas da história ocidental moderna.

Carlos Saura (o mesmo diretor de “Carmen” e “Tango”) está preparando um longa de ficção chamado “33 dias”, em referência ao tempo que Picasso levou para pintar a Guernica. Em entrevista ao jornal O Globo, o diretor disse que pretende “mostrar como o governo espanhol, em plena Guerra Civil, encomendou a Picasso um quadro de 8 m x 4 m para o pavilhão da Espanha na Feira Internacional de Paris, em 1937, para o qual colaboraram artistas como Miró, Dalí, Calder, Henry Moore e Luis Buñuel”. Em abril daquele mesmo ano, a cidade de Guernica, na Espanha, foi bombardeada por aviões italianos e alemães. Aquele foi um ensaio para os extermínios de civis realizados ao longo da Segunda Guerra Mundial e a fonte maior de “inspiração” para Picasso.

Saura quer retratar também aspectos da vida afetiva de Picasso que, segundo ele, se confundem com o processo de criação da Guernica. Dora Maar, pintora e fotógrafa francesa, amante de Picasso, registrou dia a dia a evolução do quadro. “As fotos feitas por Dora estão no Reina Sofía, assim como os esboços usados por Picasso para fazer uma pintura que pode ser encarada como um dos testemunhos mais impressionantes da inutilidade da guerra”, diz.

Saura ainda não definiu quem será o ator que interpretará Picasso no filme e, por enquanto, se ocupa com a escolha das locações na Espanha e em Paris. O filme “33 dias” ainda não tem data de estreia, mas é certo que sai em 2012, ano em que o diretor espanhol completa 80 anos de vida e 55 anos de carreira.