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Há 130 anos, começava a construção da Torre Eiffel

Foi exatamente na data de hoje, em 26 de janeiro (só que de 1887), que os primeiros dos 2,5 milhões de rebites da Torre Eiffel começaram a ser martelados. Mas essa que hoje é o símbolo de Paris, o cartão postal mais popular da Cidade Luz, nem sempre foi visto com bons olhos. Em Paris – Biografia de uma cidade, o historiador Colin Jones (que no livro conta tudo e mais um pouco sobre a capital francesa) oferece um texto especial sobre a Torre Eiffel, contando a respeito de um abaixo-assinado que foi feito assim que as obras tiveram início:

Paris_biografia“A Torre Eiffel, que nem mesmo a gananciosa América, temos certeza, não quereria, é a desonra de Paris. Todo mundo sabe disso, todo mundo fala nisso e todo mundo está profundamente aborrecido com isso – e somos apenas o débil eco da opinião pública universal, que, com todo direito, está alarmada. Basta imaginar uma torre vertiginosamente ridícula dominando Paris como uma gigantesca e negra chaminé de fábrica, esmagando com maciça barbárie a catedral da Notre-Dame, a Sainte-Chapelle, a torre Saint-Jacques, o Louvre, o domo do Hôtel des Invalides, o Arco do Triunfo etc.”

Em 1887, o abaixo-assinado do qual se extraiu essa passagem foi subscrito por um elenco estelar de cerca de cinquenta intelectuais, inclusive os escritores Alexandre Dumas, Leconte de Lisle e Guy de Maupassant, o arquiteto Charles Garnier, compositores Gounod e Massenet, o dramaturgo Victorien Sardou e vários arquitetos. Esses declarados “amantes apaixonados da beleza” assumiram a condição de represenantes de todos que amavam a Paris histórica, mas desprezavam o pensamento de que ela pudesse ser profanada pela “odiosa sombra dessa coluna oca de metal” cuja construção estava recém começando. (…)

A base da Torre Eiffel no início de sua construção

Em defesa da Torre, Gustave Eiffel, o engenheiro responsável por sua construção escreveu uma resposta espirituosa:

“Foi devido a seu valor histórico que as pirâmides causaram impacto tão poderoso sobre a imaginação humana? (…) a torre será o edifício mais alto construído pelo homem. Por que o admirável Egito deve se tornar odiável e ridículo em Paris?”

Hein?

A Torre Eiffel está pronta

Foram 785 dias de trabalho até que, em 31 de março de 1889, a Torre Eiffel estava finalmente pronta. A inauguração para o público, no entanto, só aconteceria em 6 de maio daquele ano, durante a Exposição Universal que comemorou os cem anos da Revolução Francesa. A Torre Eiffel causaria impacto não apenas em Paris, como no mundo inteiro. Hoje, não há quem desconheça seu desenho, quem não saiba, mesmo sem nunca ter ido à Cidade Luz, como são suas formas. Os turistas a visitam com fome de fotos e suas miniaturas são vendidas aos milhares na formato de chaveiros e souvenirs em geral. Abaixo, algumas breves passagens de “Paris – biografia de uma cidade”, premiado livro de Colin Jones que traz ótimos textos sobre essa que é um dos maiores símbolos arquitetônico da era moderna.

“A torre transcendia os cânones artísticos; transcendia também quaisquer noções de função prática. No final, foram encontradas utilizações para ela: um transmissor de telegrafia foi erguido em 1908, e em seguida outro para a televisão; o topo servia também de posto de observação militar. Também tem sido usada como grande outdoor publicitário e como estação metereológica. Mas todos esses fins mundanos poderiam ter sido atingidos de outras maneiras. Para todos os efeitos, a torre é de uma inutilidade sublime.”

“Ponto turístico por excelência, a torre transcende também noções triviais de turismo. Como obervou Roland Barthes, o mais perspicaz comentarista da torre: não há um lado interno no qual o turista entra; de fato, a torre não tem conteúdo. De certo modo não há nada para se ver na torre – a não ser Paris. O local que dá o panorama mais abrangente da cidade é igualmente presença inevitável no horizonte em todas as partes de Paris. Não é de se admirar que Guy de Maupassant comesse no restaurante da torre: ali era, afirmava ele, ‘o único lugar em Paris em que a pessoa não a enxergava!´”

“O desafio da torre estimulou desafios mais idiossincráticos. Pessoas tentaram voar pelo meio dos pilares (1926, com insucesso; 1945); saltar de para-quedas (1912); descer de bicicleta (1923); subir correndo a pé (1905); subir usando técnicas de montanhismo (em vez de subir pelos elevadores; 1954), de motocicleta (1983) e de mountain bike (1987); e assim por diante.”

Em 6 de maio de 1889 a Torrei Eiffel foi aberta para receber visitantes

Em 6 de maio de 1889 a Torrei Eiffel foi aberta para receber visitantes

A Torre Eiffel no dia em que ficou pronta: 31 de março de 1889 / © Louis-Emile Durandelle

Além de Paris – Biografia de uma cidade, a L&PM publica Nos céus de Paris, de Alcy Cheuiche, Paris: uma história, na Série Encyclopaedia e Satori em Paris, de Jack Kerouac.

Como diria Humphrey Bogart…

Por Ivan Pinheiro Machado

Sempre teremos Paris – 1

Tanto o maravilhoso livro “Paris: biografia de uma cidade” de Colin Jones (L&PM, 2004), como “Paris: uma história”, da Série Encyclopaedia (Coleção L&PM Pocket) de Yvan Combeau, apontam as origens da cidade de Paris para mais de três séculos A.C. quando a tribo celta Parisii estabeleceu-se nas margens do Sena, próximo ao que hoje conhecemos com Ilê de la Cité. Onde, aliás, está a Polícia Judiciária, local de trabalho do nosso querido Comissário Maigret.  Passou a ser Lutécia, quando o imperador romano Julio César derrotou o gaulês Vercintorix. O nome Paris foi consagrado no século III, sob o Império Romano. Em 451, sofreu o assédio dos bárbaros, chefiados por Átila, que desorganizou a geopolítica da Europa.  Recuperou-se, seguiu sendo uma cidade romana, até que, em 481, Clóvis I assumiu o poder, depois de derrotar o último exército romano. De lá para cá, Paris criou uma mitologia apoiada numa longa e fascinante história. E entre centenas de odisseias, foi palco da Revolução Francesa de 1789. A revolução que mudou o mundo. A partir dela, o ocidente começou a sair das sombras do autoritarismo, do feudalismo e sob as divisas generosas de “liberdade, igualdade e fraternidade” contaminou os continentes com seu humanismo radical. Max Gallo, consagrado escritor e historiador francês escreveu o belo “Revolução Francesa” dividido em dois volumes (“O povo e o rei” e “ Às armas cidadãos!”). Lançado na França em 2006, este livro obteve enorme êxito de público, atingindo o topo das listas dos best-sellers, pois pela primeira vez a história da “Revolução” foi contada com agilidade de uma reportagem e a emoção de um romance. Em setembro, a L&PM  lançou a versão pocket deste extraordinário trabalho de Max Gallo.

Sempre teremos Paris – 2

A mitologia que envolve a cidade vem sendo cuidadosamente aquecida através dos séculos. Nem Henrique IV, protestante, ao assumir o trono de Paris, em 1593, resistiu aos encantos da cidade. Constrangido por motivos políticos em converter-se ao catolicismo, disse a célebre frase: “Paris vaut bien une messe” (Paris vale uma missa). Modernamente, a cidade foi beneficiada por duas leis fundamentais para sua imortalidade. A primeira fez 50 anos, a Lei Malraux de1962 que regula a conservação definitiva dos prédios antigos históricos ou não, fixando vantagens fiscais para a sua restauração. A segunda lei, de 1968, também de André Malraux, no tempo em que foi ministro de De Gaule, prioriza o pagamento do imposto de transmissão de herança – no caso de espólios de grandes artistas ou colecionadores – em obras de arte cedidas em uso fruto ao governo e aos “Museus Franceses”. Graças a esta lei é que existe o Museu Picasso, com centenas de obras do mestre e milhares de doações de telas dos maiores pintores da história para os grandes museus da França. Nesta mesma linha, de cultuar e preservar o seu passado, é uma tradição da cidade registrar com placas nas ruas o endereço de grandes homens ou de grandes feitos, assim como homenagear os seus heróis que “caíram em defesa da França” durante a  segunda Grande Guerra. Veja abaixo alguns exemplos, como o prédio em que Picasso pintou Guernica, uma das obras de arte mais célebres de todos os tempos e que por coincidência serviu também de cenário para uma das obras mais famosas de Balzac, publicadas na Coleção 64 Páginas”: “A obra-prima ignorada”.

 

Sempre teremos Paris – 3

Uma cidade como Paris, com uma história conhecida há bem mais de 2 mil anos, tem muitas e muitas tradições,  lendas e superstições que vão nascendo e se realimentando através do tempo. Há uma (que já registramos neste blog) que é muito recente, não tem 10 anos. A tela de arame que serve de murada na Pont des Arts (uma das pontes sobre o rio Sena, só para pedestres) está abarrotada de cadeados como você pode ver na foto abaixo. A outra foto é da década de 90, que mostra como era a ponte antes. Sabe-se lá de onde veio, mas esta é uma das (poucas) fórmulas do amor eterno; você compra um cadeado, escreve o seu nome e o do seu amor (de preferência dentro de um coração), fecha este cadeado na tela da Pont des Arts em Paris, joga a chave no Sena e… pronto. Este amor será para sempre.

A Pont des Arts hoje, repleta de cadeados

A Pont des Arts no início dos anos 90. À esquerda, Ivan Pinheiro Machado. No centro, Laís Pinheiro Machado. À direita, Eduardo Bueno

Sempre teremos Paris – 4

Talvez o dia 25 de agosto de 1944 seja a segunda maior data da França. Foi neste dia que as brigadas irregulares, as forças da Resistência Francesa, a guarnição França Livre mais as Forças Francesas do Interior, apoiadas pela 4ª. Divisão de Infantaria do Exército dos Estados Unidos, entraram definitivamente em Paris para expulsar as forças nazistas que ainda lá se mantinham. Há muitas histórias que cercam este dia mágico. Uma das mais saborosas está contada no livro de Dan Frank “Minuit – Les aventuriers de l’art moderne (1940-1944)” e revela bem o clima daquele dia. Algumas tropas de combatentes não alinhados tinham se antecipado aos exércitos regulares que invadiram Paris. O escritor Ernest Hemingway e o também escritor André Malraux eram veteranos da Guerra Civil Espanhola, onde tinham lutado nas brigadas internacionais ao lado dos republicanos contra o ditador fascista, o generalíssimo Francisco Franco. Ambos estiveram presentes na tomada de Paris. Esta é a história que encerra o livro:

“Malraux e seus “maquis” encontram Hemingway e seu grupo de “resistentes” armados no dia da libertação. Eles estão bebendo no bar do Hotel Ritz depois de expulsarem os últimos alemães, requisitarem suítes e colocar os “guerrilheiros” para descansar. Neste mesmo momento, o General De Gaule, as forças da França Livre mais os americanos recém cruzavam as fronteiras da cidade. Ambos estão bêbados. Malraux vê Hemingway e exclama:

– Ernest!
Eles não se vêem desde a Guerra da Espanha.
– De onde você vem?
– De longe. Strasburgo… E você?
– Eu estava em Rambouillet – responde Hemingway.
– Você está só?
– Não, eu tenho uma pequena tropa. E mostra três “maquis” que dormem nos sofás do bar.
Malraux sorri e pergunta:
– Quantos homens você comandou nesta guerra?
Hemingway pensa, faz um pequeno cálculo e diz:
– Às vezes dez, às vezes duzentos. E você?
– Eu? O coronel pensa e diz – dois mil homens.
– Pena que não nos encontramos antes, replica Hemingway, se levantando.
Ele boceja, se espreguiça e se volta para o chefe da legendária brigada Alsacia-Lorena:
– Se você estivesse conosco teríamos tomado esta cidadezinha há muito tempo…
– Que cidadezinha? Pergunta Malraux.
– Paris!

Hemingway em 1944