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Eu e Jack Kerouac em Buenos Aires

Por Paula Taitelbaum

Buenos Aires é o reino encantado das livrarias e dos cafés. Uma e outro convivem como que em um casamento, misturando seus aromas e texturas: em toda livraria há sempre um café. E em todo café há sempre alguém lendo um livro. Já estive incontáveis vezes na capital portenha e, mesmo assim, ela sempre é capaz de me oferecer uma livraria desconhecida. Foi o que aconteceu neste último final de semana. Caminhando pela Calle Honduras, em Pallermo Hollywood, fui atraída primeiro pelo letreiro e depois pela vitrine de “Libros Eterna Cadência”.  Chegando perto,  meus olhos encontraram-se com um velho amigo: Jack Kerouac.

Ali estava ele, amarelo esverdeado (ou seria verde amarelado?), deitado do outro lado do vidro. Mas o que mais chamava a atenção era uma palavra impressa na capa: “Poesía”. Entrei e fui direto pedir para ver o livro. O dono precisou pegar o exemplar da vitrine, já que era o único que o estabelecimento oferecia. Informou-me também que era raro encontrá-lo e que aquele tinha vindo da Espanha, uma edição bilíngüe da Bartleby Editores. E ali fiquei eu, emocionada, com os Haikais de Kerouac nas mãos. Nunca tinha lido nenhum – e não consegui mais parar de ler. Os pequenos poemas em três versos trazem imagens que, obviamente, em algum momento, estiveram no campo de visão de Kerouac. Folhas caídas no parque, um barco ao longe, a bruma dos bosques, uma sopa sobre a mesa, um campo de beisebol. Tudo foi capaz de virar um pequeno poema sob a pena do autor de On the Road. O “Libro de jaikus”, tradução espanhola para o original “Book of Haikus”, traz mais de 500 Haikais. Comprei o livro, trouxe para a editora. Quem sabe um dia ele não saia por aqui e se junte aos tantos Kerouacs que temos?

Literatura e café: na cafeteria da Eterna Cadência, os livros fazem parte da decoração

E pra dar um gostinho do conteúdo que tenho nas mãos, seguem dois Haikais de Jack (tomei a liberdade de traduzir):

First December cold                                                         

wave  – not even                                                       

One cricket  

Dezembro, primeiro frio 

em ondas  –  não anda              

Nenhum grilo

 

No telegram today 

Only more                                                                                         

Leaves fell      

Hoje nenhum telegrama

– Só mais   

Folhas caídas na grama