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Chester Himes, a alma genial do Harlem

Por Ivan Pinheiro Machado

Chester Himes era negro e marginal. Não por acaso ficou conhecido como um dos grandes escritores do gênero “noir”. Esta palavra remete ao “sombrio” e foi cunhada na França para batizar romances policiais, digamos assim, mais literários. São histórias protagonizadas por personagens ambíguos, em tramas banais, contracenando num mundo hipócrita e duro, habitado por perdedores, delinquentes, aproveitadores, escroques de todos os tipos e dois ou três sujeitos que valem a pena. A esse gênero, que reúne personagens antológicos como os detetives Philipe Marlowe, de Raymond Chandler, Sam Spade, de Dashiell Hammet, e Lew Archer, de Ross Macdonald, Chester Himes agregou sua dupla Jones Coveiro e Ed Caixão, detetives da delegacia mais animada do Harlem dos velhos tempos. Só que Coveiro e Caixão são negros, numa época em que ser negro não era exatamente como é nos tempos de Barack Obama.

O Harlem era um gueto maldito na ponta norte de Manhatan, controlado por traficantes, cafetões, jogadores e seres afins. Decididamente não era um lugar para amadores. Chester Himes soube como niguém captar o clima, a atmosfera complexa e perigosa do Harlem. A sensualidade do blues é combinada com o ceticismo desolado de Jones Coveiro e Ed Caixão, submetidos a realidade precária e violenta de um lugar abandonado pela América branca e protestante. Considerado um dos grandes escritores americanos do século passado, Himes enfrentou em seus livros a realidade racista dos anos 50, o dilema vivido pelos detetives num lugar onde só “negro podia prender negro”. Seus livros são documentos pungentes onde ele desnuda sem perdão esse lado sombrio da América pós-guerra.

Muito antes de se tornar um famoso romancista, Himes foi um criminoso. Em novembro de 1928, roubou um Cadillac, dinheiro e algumas joias de um casal de idosos em Ohio. Preso aos 19 anos, teve de cumprir pena por roubo a mão armada por sete anos e meio. Foi durante esse período que começou a escrever. Suas histórias foram publicadas em diversos periódicos norte-americanos, como Atlanta Daily World e Esquire. Seu primeiro romance publicado, If He Hollers, Let Him Go (1945), já tem o racismo como tema central. Foi ignorado no seu país e celebrado no exterior, sobretudo na França. Em meados da década de 1950, exilou-se em Paris, onde conviveu com os também escritores negros, norte-americanos e expatriados James Baldwin, Ralph Ellison e Richard Wright. Foi de lá que escreveu e publicou, em 1957, For Love of Imabelle (posteriormente rebatizado de A Rage in Harlem e publicado pela L&PM Editores como A maldição do dinheiro), o primeiro de nove thrillers passados no Harlem com Coveiro e Caixão como protagonistas. A série teve enorme sucesso. Entre seus títulos mais conhecidos estão O Harlem é escuro (Blind Man with a Pistol), A louca matança (The Crazy Kill), Um jeito tranquilo de matar (The Real Cool Killers), todos publicados na Coleção L&PM Pocket, além de Cotton comes to Harlem The Heat’s On. Dois de seus livros foram adaptados para o cinema: Cotton Comes to Harlem, dirigido por Ossie Davis em 1970 (trailer abaixo), e A maldição do dinheiro, estrelado por Gregory Hines e Danny Glover em 1991.