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O genial e misterioso Leonardo da Vinci

Leonardo_da_Vinci_altaPode-se dizer que Leonardo da Vinci teve uma infância feliz? Pelos critérios do século XXI, seguramente não. Uma infância sem pai e com pouquíssima presença da mãe, quase sem autoridade e sem verdadeira escola, sem limites, sem imposições… Sem muito amor, mas, com certeza, uma infância livre, uma infância selvagem, uma infância imensa. Numa paisagem que tece o pano de fundo dos sonhos de todo europeu do Sul, em meio a oliveiras plantadas desde a Bíblia, vagando sob a árvore da civilização, acompanhado do canto das cigarras, do ruído do vento nas folhas de figueira e amendoeiras perfumadas, dos regatos que correm entre uma colina e outra, ele é o filho selvagem do campo da Toscana. Entre Siena, Pisa e Florença, Vinci e Anchiano, entre vinhedos e ciprestes, charnecas e matagais, ele percorre esse lugar como quem respira. Diante dele, a perder de vista, colinas onduladas, casas e esplanadas, os troncos nítidos e negros dos pinheiros recortados sobre arcadas brancas, das oliveiras de folhas descoradas, dos carvalhos de folhagens estranhamente azuladas, dos loureiros, dos ciprestes em forma de lança… (Trecho de Leonardo da Vinci, de Sophie Chauveau, Série Biografias L&PM).

O genial Leonardo da Vinci nasceu em 1452, supõe-se que no dia 15 de abril. “Supõe-se” porque, na verdade, muita coisa ainda é mistério e dúvida na vida do criador da Mona Lisa. Inclusive seu verdadeiro rosto. Em 2009, dentro da programação do TED, o artista plástico e ilustrador Siegfried Woldhek apresentou, em uma palestra de apenas 4 minutos, o verdadeiro rosto de Leonardo da Vinci. Vale a pena assistir e depois ler a biografia escrita por Sophie Chauveau:

O reencontro das virgens de Leonardo

Em abril de 1483, ou seja, um ano após sua chegada [em Milão], consegue finalmente uma encomenda séria, por intermédio de Ambrogio e Evangelista Predis. Trata-se do famoso retábulo da Virgem dos Rochedos. (…) 

Em vez de prender-se ao tradicional grupo estático de uma Virgem com o Menino cercada de anjos e profetas, ele se lança na representação de uma antiga lenda que imagina o encontro do Menino Jesus com o jovem João Batista em pleno deserto. Lenda bastante iconoclasta, embora até o momento ninguém se inquiete com ela. Essa encenação audaciosa, quase herética, permite a Leonardo pintar uma fabulosa paisagem de rochedos e maciços, a ponto de fazer dela o principal ator em cena, carregando-a de valor simbólico como no mito da caverna. A Imaculada funde-se com a maternidade virginal, o interior e o exterior se alternam em ambientes densos e úmidos, jogos de luz artificial mostram as trevas como uma luva virada pelo avesso. “O útero da terra que revelaria o mistério das forças vitais em suas cavidades percorridas pelas águas fundadoras…”, assim Leonardo percebe sua Virgem dos Rochedos

Embora não seja o primeiro a pintar madonas dessacralizadas – foi Filippo Lippi quem primeiro tratou a Virgem como mulher carnal, sensual e até mesmo excitante – Leonardo oferece a Maria o amor materno e a ansiedade que sempre o acompanham. Torna-a familiar, comovente e muito jovem, com aquele incrível sorriso misterioso que flutua sobre seu turbulento filho. Suas madonas vão servir de modelo aos pintores dos séculos vindouros. (…) 

O trecho acima está no livro Leonardo da Vinci, de Sophie Chauveau (Série Biografias L&PM) e ganha destaque aqui porque, ontem, 28 de julho, foi anunciado no periódico britânico The Guardian que o quadro em questão, Virgem dos Rochedos vai estar exposto ao lado de outro quadro de Leonardo da Vinci chamado… Virgem dos Rochedos. É isso mesmo que você leu: duas telas de mesmo nome, pintadas pelo mesmo gênio, vão estar finalmente juntas num mesmo museu.  Esclarecendo: da Vinci pintou duplamente a mesma cena descrita no início deste post. A primeira não só foi negada pelo mecenas que a encomendou como Leonardo foi obrigado a pintar uma Virgem dos rochedos mais “conveniente”. Veio daí a segunda (que não se sabe ao certo em que ano foi finalizada), levemente diferente da original, em que João Batista ganhou um crucifixo para que as pessoas conseguissem identificá-lo. 

A primeira versão está no Louvre, em Paris, e a segunda na National Gallery de Londres. Mas agora, graças à aguardada exposição “Leonardo da Vinci: Painter at the Court of Milan”, que começa em novembro, o museu frances vai emprestar a sua Virgem para o museu inglês para que ambas possam ficar lado a lado e o público tenha a chance de compará-las. Uma espécie de “jogo dos sete erros” para os amantes das belas artes (que você até pode tentar fazer aqui, clicando na imagem acima para aumentá-la).