Ontem, 31 de outubro de 2012, circulou o último número do Jornal da Tarde, 46 anos e 15.409 edições depois da sua fundação. O JT era editado pelo Estadão e tem nas suas origens um projeto inovador capitaneado por Mino Carta, o italiano que tornou-se um dos mais importantes e influentes jornalistas brasileiros. Nós, hoje velhos jornalistas, que fomos muito jovens no início dos anos 70, tínhamos como um dos principais paradigmas de modernidade e resistência à ditadura O Estado e S. Paulo e o JT. Com seus títulos ousados, sua diagramação imprevisível, fotos muito abertas, explorando os brancos das páginas, certas edições do JT eram verdadeiras obras de arte como design gráfico. A ideia era essa. Enquanto o Estadão desafiava a ditadura colocando trecho dos “Lusíadas” de Camões no espaço de matérias que eram amputadas pela odiosa censura prévia que foi imposta ao jornais, o Jornal da Tarde inovava, era admirado e reverenciado – e às vezes incompreendido – confundindo censores e, muitas vezes, os leitores. Um de seus principais repórteres, Marcos Faermann, o Marcão, foi nosso amigo próximo e migrou de Porto Alegre para São Paulo para fazer parte da seleta e invejada equipe do JT. Muitas vezes ele narrou para nós as peripécias do jornal, as invenções gráficas e as manchetes incríveis, como a publicada no dia da morte de Tom Jobim: “Brasil perde o Tom”. E sobretudo, o Marcão falava do sacerdócio que era ser coerente o tempo todo numa experiência inovadora, tendo que driblar diariamente os trogloditas da censura. Há uma geração inteira tomada de uma remota melancolia. De certo o JT não vendia mais, não significava economicamente mais do que um sacrifício financeiro para a editora que o mantinha, no caso O Estado de S. Paulo. Acredito até que a lenda tenha dado uma sobrevida para o jornal. Mas os tempos são outros, os meios são outros, as mensagens são outras. O Jornal da Tarde não resistiu à era digital. Mas saiu das bancas para entrar na história. Foi a mais radical experiência de um jornal diário na imprensa brasileira e graças a ele tivemos grandes momentos de excelência, de alegria e a consciência de que, em algum lugar, era possível ter a liberdade de inventar. (Ivan Pinheiro Machado)
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Fernando Pessoa e o Tejo
O rio Tejo, que corta Portugal de oeste a leste, é personagem típico na literatura feita no país. Nos versos de Fernando Pessoa, um de seus poetas mais ilustres, não seria diferente. Ouça a seguir o poema O rio da minha aldeia, do livro Poesias (Coleção L&PM Pocket), interpretado por Tom Jobim no CD Música em Pessoa, lançado em 1985, por ocasião dos 50 anos da morte do poeta português.
O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que veem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal
Toda a gente sabe disso
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.
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