Por Juremir Machado da Silva*
Flávio Tavares é um jornalista que dispensa apresentações. Está na cena brasileira há mais de 50 anos. Esteve preso no Brasil e no Uruguai. Viveu no exílio. Em 1961, como diz a fórmula consagrada, foi testemunha ocular dos episódios da Legalidade. Mais do que isso, como jornalista de Última Hora, foi protagonista da grande aventura, entrincheirado no Palácio Piratini, ombreando com os heróis do momento. Com base nesse currículo altamente legitimador, Tavares não poderia deixar de apresentar a sua visão do que aconteceu quando o doido do Jânio Quadros renunciou e os reacionários e não menos doidos ministros militares tentaram impedir a posse de Jango, o rico fazendeiro visto como comunista, sendo frustrado pela reação comandada pelo intrépido e desconcertante Leonel Brizola. O relato de Flávio Tavares está em “1961, O Golpe Derrotado – Luzes e Sombras do Movimento da Legalidade” (L&PM), que será lançado hoje à noite em Porto Alegre.
A primeira página do livro de Flávio Tavares já diz tudo com um “efeito credencial”, um altamente legitimador “eu estava lá”, “eu fui parte dos acontecimentos”, “eu vi tudo”, um fac-símile de uma carta enviada pelo autor, no calor da refrega, ao governador Brizola avisando-o da interceptação de uma mensagem de Brasília ordenando (ou sugerindo) a sua prisão em nome da “normalização da ordem pública”. As 231 páginas do livro são uma narrativa minuciosa e sem fissuras dos 13 dias que sacudiram o Brasil, colocaram o Rio Grande do Sul, mais uma vez, na linha de frente das questões nacionais e despertaram o interesse de boa parte do mundo por mais uma tentativa de golpe militar ao Sul do Equador. O golpe em si seguia os padrões tradicionais. A resistência é que se mostrou diferente. Flávio Tavares põe essa diferença em destaque.
Disposto a jogar luz em cima das sombras que encobrem a Legalidade, Flávio dá detalhes de acontecimentos que testemunhou. Por exemplo, dois encontros de Brizola com Che Guevara, em Montevidéu, poucos dias antes da crise brasileira. Essas conversas teriam influenciado Brizola, que teria ficado impressionado com o charme, o carisma e a aura romântica do guerrilheiro argentino convertido em alto mandatário cubano. Depois de churrasquear com Che e vê-lo desafiar publicamente os Estados Unidos no discurso na reunião para a oficialização da Aliança para o Progresso, em Punta del Este, o destemido e idealista Leonel não poderia deixar por menos no seu terreiro de atuação.
O livro começa com uma curiosa descrição de uma situação entre Flávio e um soldado da Brigada Militar dentro do Palácio Piratini. Flávio mostra sua voz de comando: “Um martelo e uma escada comprida, que chegue ao teto. Mas rápido”. O soldado obedece. Flávio sobe, quebra três vitrais na janela oval e abre espaço para instalar uma metralhadora. Guerra é guerra. A grande batalha, como em 1930, não aconteceria. O golpe seria adiado para 1964. O “soldado” Flávio apresentou suas armas naquele dia. Ficaria em guerra por muitos anos. Talvez ainda continue.
*Este texto foi publicado originalmente na coluna de Juremir Machado da Silva no jornal Correio do Povo, na edição de 7 de março de 2012.
Autógrafos do livro 1961: o golpe derrotado
Em Porto Alegre:
HOJE, 7 de março, às 19h, na Saraiva Megastore do Shopping Praia de Belas
No Rio de Janeiro:
20 de março, às 19h, na Livraria Argumento