Diário do Anonymus em Paris – 1° Dia

   

Por José Antonio Pinheiro Machado 

Foi aberta hoje em Paris a Paris Cookbook Fair, a Feira Mundial do Livro de Gastronomia. O lugar escolhido não poderia ser mais adequado, o Le 104 é o mais novo espaço cultural de Paris, no 19.eme arrondissiment, distante dos lugares mais tradicionais da cidade, mas que poderá se tornar uma nova onda. É um espaço curioso. Ali funcionava no século XIX o serviço de “Pompas Fúnebres Municipais de Paris”, que cuidava dos funerais de “loucos, desvalidos e mulheres divorciadas.” Tornou-se obsoleto, é claro, e surgiu a boa idéia de reaproveitar aquele grande pavilhão de aspecto lúgubre para usos mais luminosos…     

O "Le 104", sede da primeira edição da Cookbook Fair / Foto: Divulgação

 Para começar, agora o pavilhão é todo branco, mas não renega sua origem. No pórtico de entrada está lá, como era antigamente: “Pompas fúnebres de Paris”.  Mas hoje, como disse um porteiro quando Anonymus se surpreendeu com a inscrição, “aqui é um lugar que era de morte e agora é de vida”. E a primeira Paris Cookbook Fair tem os contratempos naturais de uma vida que começa. Poucos antes da abertura os colombianos não sabiam onde ficar, os brasileiros tiveram que mudar por conta própria detalhes do estande e os guardas não deixavam entrar os jornalistas que não tinham credecial: mas eles queriam entrar justamente para se credenciar…  

Resolvidas as confusões do parto, os mais de 4.000 m² de área viraram festa, reunindo editores, autores, chefs, fotógrafos e produtores vindos de mais de 100 países. Além de conferências, palestras de editores e autores de livros ligados ao mundo da gastronomia e do vinho, performances de 62 chefs de todo o mundo estão programadas no “Show Kitchens”.  O comandante da festa tem linhagem: é Monsieur Edouard Cointreau, da família que produz o licor mais consumido do mundo e que criou sua própria tradição pessoal: é presidente da Gourmand Magazine. Desde as entrevistas preliminares, ele contagiou a todos com seu entusiasmo: “Será uma feira de livros diferente de todas. É aberta para todos – grandes e pequenos -, vindos de todos os países do globo”. Segundo Monsieur Cointreau, o mercado de livros ligado à gastronomia é um dos mais rentáveis do mundo e “precisávamos de um encontro desta importância planetária”.  

Entre os milhares de livros expostos nos diversos estandes, algumas curiosidades: chocolate, disparado, é o tema dominante dessa amostra da literatura gastronômica, frango – cada vez mais presente nas mesas do mundo – aparentemente não atrai leitores, escritores e editores, e impressiona o volume de obras com receitas e dicas de alimentação infantil. E um dado dominante: em todas as categorias e sabores, a maioria absoluta dos autores procura mostrar a gastronomia como uma arte fácil e sem mistérios. Parece que chega ao fim o império dos chefs inescrutáveis de receitas impossíveis de compreender. Os leitores parecem mais interessados em receitas fáceis, simples e saborosas que possam ser reproduzidas com facilidade no fogão de casa.

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