Por Cristine Kist*
Se algumas paredes têm ouvidos, como garantiam nossos avôs, outras bem parecem ter boca. As da Estação Pinacoteca, por exemplo. As paredes da Estação gritam contradições desde o dia 20 de março, quando foi aberta a exposição “Andy Warhol, Mr. America”. Estão elas todas cobertas de citações, palavras conhecidas e desconhecidas, os 15 minutos de fama e à renegação das espinhas.
Logo na entrada são desfeitas as ilusões dos que esperavam confirmar a suspeita de que Warhol era um artista, uma pessoa ou um artista e uma pessoa apenas superficial. Os visitantes já são recebidos com uma citação digna de grande pensador:
“Everybody has their own America, and then they have pieces of a fantasy America that they think is out there but they can’t see. When I was little, I never left Pennsylvania, and I used to have fantasies about things that I thought were happening in the Midwest, or down South, or in Texas, that I felt I was missing out on. But you can only live life in one place at a time. And your own life while it’s happening to you never has any atmosphere, until it’s a memory.”
Pois é. E depois de ler isso o sujeito mais desprevenido já fica inclinado a cometer duas injustiças. A primeira é pensar que são imprensa e crítica as responsáveis pelo rótulo que Warhol carrega. Não. Ele mesmo fazia questão de se vender assim. A segunda é concluir que de superficial ele não tinha nada. Tinha muito.
Quando perguntavam se as 32 latas de sopa Campbells, os retratos de presidiários e os autorretratos como drag queen eram uma crítica ao american way of life, ele negava e jurava de pés juntos que amava os Estados Unidos e não tinha qualquer intenção de mostrar o “lado feio” do país.
Muito provavelmente estava sendo sincero.
A impressão é de que Warhol era contraditório até para ele mesmo. Batia e acariciava. É preciso mesmo muita força de vontade para acreditar que obras como “Confronto racial” ou os vários retratos coloridos de uma mesma cadeira elétrica estejam ali apenas por motivos estéticos. As latas de sopa também não são exatamente bonitas. E os bandidos mais procurados até são bonitos, mas bom, não deve ser só por isso que estão ali.
Nunca gostei de meio termo. Sempre achei que meio termo fosse para os fracos. Me rendi. Sou fraca. Andy Warhol, aquela figura excêntrica e cheia de extremos, está mesmo no meio termo entre algo que lembra o intelectual e algo que lembra o superficial. É essa a sua última contradição.
A exposição fica na Estação Pinacoteca até 23 de maio, de terça a domingo, sempre das 10 às 18h. E aos interessados em conhecer um pouco mais da personalidade de Warhol, uma bela dica é o livro de quase mil páginas “Diários de Andy Warhol”, publicado pela L&PM em 1989, e agora disponível nos melhores sebos do Brasil.
* Cristine é assessora de imprensa da L&PM
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